3º Domingo do Tempo Comum
Muitas pessoas já tentaram escrever a história dos
acontecimentos que se realizaram entre nós, como nos foram transmitidos
por aqueles que, desde o princípio, foram testemunhas oculares e ministros da
palavra.
Assim sendo, após fazer um estudo cuidadoso de tudo o que aconteceu desde o
princípio, também eu decidi escrever de modo ordenado para ti, excelentíssimo
Teófilo.Deste modo, poderás verificar a solidez dos ensinamentos que recebeste.
Naquele tempo, Jesus voltou para a Galileia, com a força do Espírito, e
sua fama espalhou-se por toda a redondeza. Ele ensinava nas suas
sinagogas e todos o elogiavam.
E veio à cidade de Nazaré, onde se tinha criado. Conforme seu costume, entrou na sinagoga, no sábado, e levantou-se para fazer a leitura.
HOJE SE CUMPRIU ESTA PASSAGEM DA
ESCRITURA ...
Este Evangelho tem duas partes:
1) Início do Evangelho de Lucas,
em que ele declara a sua intenção.
2) Jesus, citando o profeta
Isaías, expõe o programa da sua missão libertadora. Essa missão é de salvação
integral, voltada preferencialmente para os excluídos da sociedade: pobres,
cativos, cegos e oprimidos.
Para nós, como Igreja,
continuarmos essa missão de Jesus a nós confiada, temos de denunciar qualquer
opressão e exploração da pessoa humana. Denunciar e colaborar na libertação,
como fazia Jesus. Temos de praticar e promover a justiça, combatendo as forças
da morte presentes no mundo.
Contudo, não podemos julgar que o
Reino de Deus se limita à libertação temporal, pois seu conteúdo fundamental é
a salvação e a graça de Deus. Só a graça nos traz a completa libertação.
O primeiro passo é a nossa
conversão para a justiça e o amor aos irmãos. Só se entende a libertação se ela
partir de dentro de nós. Esse é o nosso desafio. Os pobres só se libertam
quando nós nos tornamos pobres, evitando todo paternalismo. O paternalismo é
justamente o rico ajudando o pobre e continuando no seu mundo de rico.
A reconstrução da figura original
do homem, restabelecida e apresentada a nós na pessoa de Jesus Cristo, exige
transforma “Cristo em minha vida e a minha vida em Cristo”. Pensar como Jesus
pensou, falar como Jesus falou, amar como Jesus amou, viver como Jesus viveu.
É magnífico o trabalho dos
artistas que restauram imagens, pinturas e afrescos que foram danificados. Cada
um de nós é chamado a ser esse artista em nós mesmos e nos nossos irmãos. É a
imagem de Deus, vocação original do homem, que é restaurada.
“Vós sois o corpo de Cristo”
(1Cor 12). O amor mútuo, que nos leva à mútua colaboração, cada um com o seu
dom, faz da Comunidade cristã o corpo vivo de Cristo presente ali no bairro.
“Se alguém disser: “Amo a Deus”, mas odeia o seu irmão, é mentiroso; pois quem
não ama o seu irmão, a quem vê, não poderá amar a Deus, a quem não vê. Este é o
mandamento que dele recebemos: quem ama a Deus, ame também seu irmão” (1Jo
4,20-21).
Os primeiros cristãos procuraram
por em prática essa denúncia de Jesus às injustiças da sociedade. Por isso
muitos foram condenados à morte. Apesar disso, a Igreja não desiste de
continuar essa missão de Jesus.
No programa, Jesus mistura o
vertical e o horizontal, a dedicação ao corpo e a dedicação à alma. Ele não as
separa, pois o próprio Criador não separou, criando-nos corpo, alma e espírito
misturados. Quem ama verdadeiramente a Deus, ama também o seu próximo,
privilegiando os excluídos. E esse amor inclui também a proteção à natureza,
evidentemente.
Neste Evangelho, Jesus fala que
veio proclamar o “ano da graça do Senhor”. Essa expressão é sinônima de “ano
sabático”. O Povo de Deus do Antigo Testamento celebrava, a cada sete anos, o
ano sabático, que não era nada mais que o descanso semanal do sábado ampliado
para um ano todo. “Durante seis anos semearás a terra e recolherás os seus
frutos. No sétimo ano, porém, deixarás de cultivar a terra, para que se alimentem
os pobres, e os animais selvagens comam o resto” (Ex 23,10-11).
O “ano da graça do Senhor”, em
Isaías (Is 61,1-2), está expresso como “ano do agrado do Senhor”. Portanto, é
viver bem com Deus, obedecendo os seus mandamentos e fazendo a sua vontade. O
livro do Deuteronômio determina que no ano sabático todas as terras deviam
voltar às tribos originais, conforme foi dividido quando o povo chegou à Terra
Santa. Também as dívidas deviam ser perdoadas e os escravos libertados.
Quando Jesus falou que veio proclamar
o ano da graça do Senhor, ele quis dizer que, de agora para frente, todos os
anos são sabáticos. O ano da graça do Senhor é um ano sabático permanente, não
só para todos os anos, mas para todos os dias do ano. Esta é a lei do novo Povo
de Deus, a Igreja.
Esse permanente ano da graça do
Senhor, custou a morte de Jesus, como oferta total dele por nós. Amar não é dar
coisas ao próximo, mas buscar a sua felicidade, mesmo que para isso precisemos
sacrificar a nossa vida. “Ninguém tem maior amor do que aquele dá a vida por
seus amigos” (Jo 15,13).
O amor só é verdadeiro se inclui,
desde o começo, uma doação da vida. O amor, ou é total, ou não é amor. Amor
parcial não existe, é apenas caricatura de amor ou egoísmo com o nome de amor.
Quando vemos um mendigo na rua e lhe damos um trocado, ou apenas um sorriso,
não lhe estamos dando apenas um trocado ou um sorriso, mas a nossa vida toda a
ele, se necessário for.
O Evangelho mostra também o
protagonismo do Espírito Santo na vida, obra e missão de Jesus. É o Espírito
que intervém desde o seu nascimento e batismo. Nós também fomos ungidos pelo
Espírito Santo no Batismo e na Crisma, a fim de atuar como Cristo atuou,
vencendo o mal do mundo e sendo mensageiro da Boa Nova.
Havia, certa vez, um homem que
admirava muito a criação de Deus, mas vivia encabulado com uma coisa: Por que
nunca chegamos até o horizonte? A gente olha, ele está a um km de nós. Se
caminhamos até lá, ele já foi para frente e está a mais um km de dós. Não
entendo, dizia ele. E nas suas orações sempre pedia uma explicação para Deus.
Um dia, Deus apareceu para ele em
sonho e lhe disse: “É para que você esteja sempre caminhando! O horizonte faz
você ir para frente, por isso que você nunca o atinge”.
A continuidade da missão de Jesus
na libertação tanto de nós mesmos como dos nossos irmãos, é como o horizonte. É
um trabalho contínuo que só concluiremos no final da nossa vida, quando nos
encontrarmos com Deus.
Maria Santíssima, a discípula
fiel do Senhor, viveu de forma plena esse programa do seu Filho. Que ela nos
ajude a vivê-lo também.
Hoje se cumpriu esta passagem da
Escritura.
* Padre Queiroz - Homilia Dominical
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